Neurociências: suas primeiras histórias
Resumo do 1º capítulo do livro de Mark Bear: Neurociências: Desvendando o Sistema Nervoso
6/24/20255 min read
Introdução
As neurociências surgiram do esforço humano milenar de entender como o cérebro funciona — desde os antigos filósofos gregos até os modernos laboratórios de neuroimagem e modelagem computacional. Neste artigo, você vai conhecer os principais marcos históricos e científicos que moldaram essa área, entender os diferentes níveis de análise e descobrir quem são os profissionais que atuam nesse campo.
1. Das origens à era pré-científica: o que se sabia antes do século XIX?
Pensamento grego e romano
A discussão sobre o papel do cérebro remonta à Grécia Antiga. Hipócrates acreditava que o encéfalo era o centro da inteligência, enquanto Aristóteles atribuía essa função ao coração. Já Galeno, no Império Romano, fez dissecções em animais e defendeu a ideia de que os ventrículos cerebrais eram canais por onde fluíam os “espíritos” responsáveis pelos movimentos e sensações.
Renascença e mecanicismo cartesiano
Durante a Renascença, Vesalius aprimorou a anatomia cerebral, embora ainda sob a influência da teoria ventricular. Já no século XVII, Descartes propôs um modelo mecânico do corpo humano, no qual a mente (imaterial) interagia com o corpo via glândula pineal. Ainda assim, a explicação dos comportamentos se baseava mais em filosofia do que em evidências científicas.
Preparando o terreno
Com o avanço da anatomia e da fisiologia nos séculos XVII e XVIII, foram feitas distinções entre substância cinzenta e branca, entre sistema nervoso central e periférico, e entre estruturas específicas do encéfalo. Esses avanços abriram caminho para a neurociência moderna, que ganharia força no século XIX.
2. O século XIX
Da eletricidade ao mapeamento cerebral
A descoberta de que os nervos conduziam sinais elétricos, e não fluídos, foi um divisor de águas. Pesquisadores como Galvani, Bell e Magendie demonstraram que as raízes dorsais dos nervos eram sensoriais, enquanto as ventrais eram motoras. Isso trouxe um novo entendimento sobre a organização funcional do sistema nervoso.
A localização de funções no cérebro foi outro grande avanço. Broca identificou uma região responsável pela fala. Fritsch, Hitzig e Ferrier mapearam áreas motoras e sensoriais por meio de estimulação elétrica em animais, e Munk relacionou o lobo occipital à visão. Pela primeira vez, havia evidências claras de que diferentes áreas cerebrais eram responsáveis por funções mais ou menos específicas.
A teoria da evolução e os modelos animais
A obra de Darwin ofereceu uma base teórica para o uso de animais como modelos em neurociência. A ideia de que estruturas cerebrais e comportamentos evoluem e se adaptam ao ambiente impulsionou estudos comparativos entre espécies, fortalecendo a pesquisa em neuroetologia e neurodesenvolvimento.
O neurônio como unidade funcional
Com a teoria celular de Schwann e o avanço das técnicas de microscopia, os neurônios passaram a ser reconhecidos como células independentes. Essa descoberta foi essencial para a formulação da “doutrina do neurônio” e estabeleceu as bases para a neurociência moderna.
3. Níveis de análise nas neurociências: Como estudamos o cérebro hoje?
As neurociências se organizam em diferentes níveis de análise para compreender melhor a complexidade do sistema nervoso.
Nível molecular e celular
No nível molecular, investigam-se neurotransmissores, receptores e mecanismos bioquímicos. No nível celular, o foco está nos neurônios e células da glia — suas funções, morfologia e comunicação via sinapses.
Nível de sistemas
As neurociências de sistemas estudam circuitos formados por conjuntos de neurônios que trabalham em conjunto para funções específicas, como visão, audição, coordenação motora ou regulação hormonal.
Nível comportamental e cognitivo
No nível comportamental, investiga-se como a atividade do sistema nervoso gera emoções, aprendizado, linguagem e sono. Já nas neurociências cognitivas, busca-se entender como funções mentais complexas, como atenção, tomada de decisão, memória e consciência emergem da atividade neural.
4. Profissionais das neurociências: quem faz neurociência no Brasil e no mundo?
As neurociências são um campo interdisciplinar. Neurocientistas podem vir de áreas como psicologia, medicina, biologia, física, computação e até engenharia. Dependendo da formação, esses profissionais atuam em diferentes frentes da pesquisa.
Pesquisa básica e experimental
É realizada em laboratórios e se dedica a descobrir os mecanismos fundamentais do funcionamento cerebral, usando modelos animais, culturas de células e tecnologias como eletrofisiologia, neuroimagem ou optogenética.
Pesquisa clínica
Conduzida por médicos neurologistas, psiquiatras, neurocirurgiões e neuropatologistas, essa vertente busca compreender, diagnosticar e tratar distúrbios neurológicos e psiquiátricos, como epilepsia, Alzheimer, Parkinson, depressão e esquizofrenia.
Neurociência computacional e teórica
Esse campo usa modelos matemáticos e simulações para explicar como o cérebro processa informações. É essencial para o avanço da inteligência artificial, da robótica e da neuroengenharia.
Referência:
BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 4ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
Conclusão
A história das neurociências mostra como nosso conhecimento sobre o cérebro evoluiu de ideias filosóficas para um campo científico robusto e multifacetado. Ao estudar seus fundamentos e níveis de análise, você compreende melhor como diferentes especialistas contribuem para um objetivo comum: desvendar os mistérios da mente e do comportamento humano.
Que tal revisar esse conteúdo respondendo algumas perguntas?
1) No século XIX, a comprovação da condução elétrica nos nervos e a distinção entre raízes dorsais e ventrais contribuíram decisivamente para o entendimento da organização funcional do sistema nervoso.
Verdadeiro ou falso?
2) A teoria dos ventrículos cerebrais como sede das funções mentais complexas, proposta por Galeno, permanece como base das neurociências modernas.
Verdadeiro ou falso?
3) No contexto histórico das neurociências, diversos paradigmas foram substituídos conforme o avanço das técnicas experimentais e da epistemologia científica.
Considerando as transições paradigmáticas e os níveis de análise em neurociência, assinale a alternativa correta:
A) A teoria do fluido cerebral como meio de transmissão de impulsos nervosos manteve-se válida até o advento da neuroimagem funcional no século XXI.
B) A concepção dualista de Descartes foi superada no século XIX com a demonstração empírica da plasticidade sináptica e do funcionamento autônomo dos ventrículos.
C) A identificação da função da substância branca como centro de processamento da linguagem foi feita por Broca ao observar pacientes com lesões no cerebelo.
D) A consolidação da doutrina do neurônio como unidade funcional do sistema nervoso foi possível apenas após o desenvolvimento da microscopia e da coloração de Golgi.
E) A neurociência cognitiva foi estabelecida por Galeno ao localizar os sentimentos no lobo frontal, baseando-se em dissecações de animais.
4) Ao longo da história, o estudo do cérebro e do comportamento passou por transformações profundas: das explicações espiritualistas e filosóficas às abordagens experimentais e computacionais.
Considerando essa trajetória, discuta: como a interdisciplinaridade nas neurociências contribui para a compreensão atual da mente humana? Tente discorrer sobre, ao menos, dois níveis de análise das neurociências e os tipos de profissionais que colaboram nesses contextos.